Games não são o problema: por que as redes sociais podem piorar concentração de adolescentes
09/12/2025
(Foto: Reprodução) Adolescentes com problemas de saúde mental passam mais tempo nas redes sociais
Adobe Stock
A revolução digital se tornou um grande experimento não planejado – e as crianças são seus participantes mais expostos. À medida que diagnósticos de TDAH aumentam pelo mundo, surge uma pergunta central: o uso crescente de dispositivos digitais pode estar desempenhando um papel?
Para investigar isso, estudamos mais de 8.000 crianças, dos dez aos 14 anos de idade. Perguntamos sobre seus hábitos digitais e as classificamos em três categorias: jogos eletrônicos, TV/vídeo (como YouTube) e redes sociais.
A última incluía apps como TikTok, Instagram, Snapchat, X, Messenger e Facebook. Em seguida, analisamos se o uso estava associado a mudanças de longo prazo nos dois sintomas principais do TDAH: desatenção e hiperatividade.
Nossa principal descoberta foi que o uso de redes sociais estava associado a um aumento gradual da desatenção. Jogar ou assistir a vídeos não apresentou esse efeito. Esses padrões se mantiveram mesmo após considerar o risco genético de TDAH e a renda familiar das crianças.
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Também testamos se a desatenção poderia levar as crianças a usar mais redes sociais. Não levou. A direção foi apenas uma: o uso de redes sociais predisse maior desatenção no futuro.
Os mecanismos de como a mídia digital afeta a atenção ainda são desconhecidos. Mas a ausência de efeito negativo de outras atividades na tela nos permite descartar uma influência geral dos dispositivos ou a noção popular de que toda mídia digital produz “picos de dopamina” que bagunçam a atenção das crianças.
Como neurocientistas cognitivos, podemos arriscar um palpite fundamentado. As redes sociais introduzem distrações constantes, impedindo a manutenção da atenção em qualquer tarefa.
Se não são as mensagens em si que distraem, o simples pensamento de que uma nova mensagem possa ter chegado já funciona como interrupção mental. Essas distrações prejudicam o foco no momento e, quando se acumulam por meses ou anos, podem gerar efeitos de longo prazo.
Jogos eletrônicos, por outro lado, ocorrem em sessões delimitadas, não ao longo de todo o dia, e envolvem foco constante em uma única tarefa.
Nem todas as telas são iguais.
Em termos estatísticos, o efeito das redes sociais não foi grande. Não foi suficiente para transformar uma pessoa com atenção normal em alguém com TDAH. Mas, se toda a população se torna mais desatenta, muitos acabam ultrapassando o limite diagnóstico.
Teoricamente, um aumento de uma hora no uso de redes sociais em toda a população elevaria os diagnósticos em cerca de 30%. Isso é uma simplificação, já que diagnósticos dependem de muitos fatores, mas ilustra como um efeito pequeno no indivíduo pode ter grande impacto populacional.
Há muitos dados sugerindo que já vimos ao menos uma hora a mais de redes sociais por dia ao longo da última década ou duas. Vinte anos atrás, redes sociais praticamente não existiam. Agora, adolescentes passam cerca de cinco horas por dia online, em sua maioria nas redes sociais.
A porcentagem de jovens que dizem estar “constantemente online” subiu de 24% em 2015 para 46% em 2023. Dado que o uso de redes sociais passou de quase zero para cerca de cinco horas diárias, isso pode explicar uma parte importante do aumento nos diagnósticos de TDAH nos últimos 15 anos.
A lacuna da atenção
Alguns argumentam que o aumento nos diagnósticos de TDAH reflete maior conscientização e menos estigma. Isso pode ser parte da explicação, mas não exclui um aumento real da desatenção.
Além disso, alguns estudos que afirmam não haver aumento dos sintomas de desatenção analisaram crianças provavelmente jovens demais para ter um smartphone, ou períodos anteriores à explosão do uso contínuo de redes sociais.
Redes sociais provavelmente aumentam a desatenção — e o uso dessas plataformas disparou. E agora? Nos EUA, é preciso ter ao menos 13 anos para criar conta na maioria das redes, mas é fácil burlar essa regra.
A Austrália está indo mais longe. A partir de 10 de dezembro de 2025, empresas de mídia deverão garantir que usuários tenham 16 anos ou mais, sob pena de multas pesadas para quem não cumprir. Vamos ver qual será o efeito dessa legislação. Talvez o resto do mundo deva seguir o exemplo australiano.
*Torkel Klingberg é professor de Neurociência Cognitiva no Karolinska Institutet.
*Samson Nivins é pesquisador de pós-doutorado em Saúde da Mulher e da Criança no Karolinska Institutet.
**Este texto foi publicado originalmente no site da The Conversation.