Pais acusam PMs envolvidos em morte de enfermeira de matarem jovens na fronteira do AC em 2020: 'Meu filho foi executado'

  • 14/12/2025
(Foto: Reprodução)
Vicente [esq] e Álvaro [dir] foram mortos em operação policial e famílias acreditam em execução e pedem reabertura do caso Arquivo pessoal Os pais dos jovens Álvaro Praxedes Santana, de 16 anos, e Vicente Ferreira dos Santos, de 19, mortos há cinco anos em uma ação policial em Brasiléia, no interior do Acre, pedem que o caso dos filhos, que foi arquivado por alegação de legítima defesa, seja reaberto. Em busca por justiça, as famílias justificam que os jovens foram executados. 👉 Contexto: Álvaro e Vicente foram mortos durante a madrugada de 2 de outubro de 2020 em Brasiléia após pedirem um carro de aplicativo. Na ocasião, estavam seis rapazes. No veículo que chegou no local, haviam policiais descaracterizados. Além das duas mortes, outros dois foram atingidos sobreviveram com sequelas e não quiseram falar com a reportagem. Os outros escaparam sem ferimentos e não moram mais na cidade. A família defende que eles chegaram atirando nos rapazes e que, posteriormente, 'plantaram' as armas para incriminá-los. Já a versão da polícia relata que houve troca de tiros e que os agentes apenas se defenderam. Entre os acusados, estão Gleyson Costa de Souza e Cleonizio Marques Vilas Boas, envolvidos na morte da enfermeira Géssica Melo de Oliveira, em dezembro de 2023. 📲 Participe do canal do g1 AC no WhatsApp Em entrevista exclusiva ao g1, o capitão do exército Antônio Lúcio Santana Júnior, pai do Álvaro, e a professora Aurieda Pereira Ferreira, mãe do Vicente, não acreditam na narrativa apresentada pela polícia sobre o dia dos fatos e pedem que o caso seja reinvestigado pelo Ministério Público do Acre (MP-AC). Ao g1, a Promotoria de Justiça Criminal de Brasiléia informou que aguarda o encaminhamento do pedido de reanálise para 'avaliar uma eventual reabertura do caso', desde que haja novas informações e evidências que justifiquem o desarquivamento do processo. (Veja mais detalhes abaixo) Ambos contrataram, um ano após as mortes, uma perícia particular elaborada pelo perito criminal aposentado Antônio Nogueira dos Santos. O resultado, segundo eles, se opõe ao que foi apresentado pela polícia. Comissão Interamericana de Direitos Humanos condena violência policial no Brasil O que dizem os pais sobre o dia do crime Antônio, que mora no Rio de Janeiro, contou que não residia com o filho mas mantinha contato constante. Ele era criado pela mãe e pelos avós maternos até o dia que foi morto. Ele comentou ainda que o motorista do carro solicitado disse que estava recebendo ligações insistentes dos rapazes e, com medo, buscou a polícia para fazer uma suposta escolta. "Aí os policiais entraram no carro dele [do motorista] e foram até o local onde estavam esses menores. Os jovens, acreditando que o carro solicitado estava chegando, se aproximaram inocentemente até perto do veículo. Os policiais desceram e atiraram, acertando quatro", explicou. Aurieda, mãe de Vicente, apresenta o mesmo relato do pai de Álvaro. De acordo com ela, o filho e os vizinhos passavam momentos tomando tereré, ouvindo som, conversando e jogando. "Fiquei sabendo que o motorista disse que vinha, depois mandou uma mensagem dizendo que não vinha mais, que ia mandar outro amigo dele, que tinha acontecido um problema no carro. E aí, com o tempo, chegaram os policiais do Gefron descaracterizados no carro, já efetuando disparos", detalhou ela. Rua onde os jovens foram mortos; círculo mostra local onde os jovens ficavam tomando tereré e jogando baralho, segundo a mãe Reprodução Ainda segundo ela, populares se assustaram com o barulho dos tiros. Vicente, morto na situação, estava sentado em cima de uma bicicleta, encostado em uma árvore que tinha no local. O primeiro tiro o atingiu na mandíbula e perfurou o guidão de sua bicicleta. "Ele foi arrastado para o meio da rua e recebeu o segundo disparo à queima-roupa que atingiu o coração dele, o disparo fatal. Depois, eles jogaram os garotos na carroceria de uma caminhonete do Corpo de Bombeiros porque a ambulância não havia chegado", complementou. A mãe ainda faz uma acusação mais grave. Ela disse que os policiais, após executarem os jovens, 'plantaram' armas e dispararam para que os rapazes fossem culpabilizados. "Eles pegaram a mão do meu garoto e de outro rapaz, colocaram uma arma na mão deles e deram vários tiros contra o carro que eles tinham utilizado para poder ir até o local: o carro de um homem que alguns meses depois foi executado. Eu sei disso porque dois dos jovens que foram baleados fingiram estarem mortos e viram quando eles fizeram isso com os dois que já estavam falecidos", explicou ela. Como o caso ocorreu na madrugada, os feridos foram levados ao hospital da cidade e os mortos ficaram no necrotério até a manhã do mesmo dia, como ressalta o pai de Álvaro que detalhou a demora para os corpos chegaram ao Instituto Médico Legal (IML) de Rio Branco, já que na época não tinha o órgão na cidade. Dois sobreviveram, um com sequelas na cabeça pois teve o crânio afetado, e o outro que pegou um tiro no abdômen, precisou usar uma bolsa de colostomia. "Durante esse tempo todo, esses policiais mexeram no local do crime, porque eles pegaram os corpos e arrastaram de barriga para baixo a uma grande distância, que foi comprovada essas escoriações faciais pelo IML de Rio Branco", detalhou ele. Relatório do perito contratado pela família demonstra tiros no carro Reprodução Supostas incoerências O pai de Álvaro questiona o porquê de não ter sido feita perícia no carro para que fosse verificado o ângulo dos tiros supostamente dado pelos filhos deles, já que a polícia argumenta que houve confronto. "Esse carro não foi recolhido pela Polícia Civil. As armas desses executores não foram recolhidas pelo comando da polícia. Eles continuaram laborando normalmente nas ruas, nem afastados foram. Fiquei sabendo que existem no Alto Acre várias denúncias de que esse grupo já matou outras pessoas", pontuou ele. Aurieda continua morando em Brasiléia depois de tudo que aconteceu. Porém, ela afirma que os outros jovens sobreviventes deste incidente decidiram sair da cidade e nunca mais foram vistos. Sobre isso, Antônio mencionou que, recentemente, contratou um investigador particular para tentar localizar os sobreviventes e testemunhas do caso. "Consegui o contato com uma das parentes de um dos menores. Eles estão sendo muito difíceis de serem achados e convencidos de falar porque temem retaliações por parte da polícia. Inclusive, um deles está com o projétil alojado na cabeça até hoje", comentou. "Eles não querem testemunhar perante a justiça. Eles têm muito medo", complementou a mãe de Vicente. Desde o sepultamento de Álvaro, o pai tenta esclarecer o que realmente aconteceu naquele dia. Segundo ele, foram enviados documentos para a Corregedoria da Polícia Militar que foram rasurados. "A Justiça só acredita nas versões dos executores. Lembrando que eles não afastaram esses policiais, não recolheram as armas deles, não fizeram a reconstituição do crime. Os menores sobreviventes, depois de medicados, foram ouvidos sem a presença dos pais e do advogado e foram forçados a falarem aquilo que a polícia queria que dissessem", acusou ele. Perícia contratada pela família A perícia alternativa contratada pelas famílias foi concluída no dia 28 de julho de 2021 e assinada pelo pelo perito criminal aposentado Antônio Nogueira dos Santos. O laudo pontuou os seguintes ferimentos nos rapazes mortos: Álvaro Praxedes Santana 1 ferimento de entrada na região do tórax, com saída próximo a virilha 1 ferimento de entrada na lombar saindo e causando a exposição de vísceras 1 ferimento de entrada na região atrás do joelho com saída na frente Foi alvejado a uma distância não superior a 40 cm, com trajetória ligeiramente inclinada (de cima pra baixo). Álvaro foi morto pela polícia em 2020 Arquivo pessoal Vicente Ferreira dos Santos 1 ferimento de entrada na região da mandíbula, sem saída 1 ferimento a curta distância no tórax Escoriações por arrastamento no rosto Vicente foi morto pela polícia em 2020 Arquivo pessoal O documento diz que, pelas características dos ferimentos das duas vítimas, pode-se afirmar que todos foram disparados a curta distância e de cima para baixo, estando o atirador em pé e a vítima em um plano inferior, ajoelhada ou sentada. Os policiais alegaram, no entanto, que o grupo disparou contra eles a 15 metros de distância. Especificamente no caso de Álvaro, os exames indicaram que os tiros foram dados enquanto o atirador estava em pé, a curta distância, e a vítima inicialmente em pé, quando foi atingida no joelho direito, depois na região da lombar e, ao cair, recebeu o terceiro disparo que o atingiu na região do tórax, na posição de cima para baixo. O perito detalhou que o local não foi preservado após o ocorrido e as armas utilizadas e os cartuchos deflagrados não foram periciados, prejudicando assim a determinação de calibre e tipo de armas utilizados. O g1 tentou contato com o perito que não respondeu e nem atendeu as ligações. Mesmos envolvidos no Caso Géssica, três anos depois Dois dos policiais envolvidos nas mortes de Álvaro e Vicente são os mesmos que respondem pelo assassinato da enfermeira Géssica Melo de Oliveira, de 32 anos, durante uma perseguição policial em dezembro de 2023. São eles: Gleyson Costa de Souza e Cleonizio Marques Vilas Boas. "Eles conseguiram matar a enfermeira com o mesmo modus operandi. Alegaram que a enfermeira tinha dado tiros na direção deles e eles atiraram na direção dela. Depois, eles plantaram uma arma ao lado do corpo para justificar que ela tinha atirado contra eles", relembrou o pai de Álvaro. Os dois policiais se tornaram réus em fevereiro deste ano. A audiência de instrução dos PMs foi marcada para abril, depois deveria acontecer em setembro e, em novembro, foi adiada pela terceira vez. O g1 tenta contato com a defesa dos PMs. Confira mais detalhes do caso aqui. Possível desarquivamento O g1 entrou em contato com a assessoria do Ministério Público (MP-AC) para verificar se, com base nesta nova perícia, o caso poderia ser reaberto e reanalisado. (Veja a nota completa abaixo) O órgão informou que, se houver outras novas informações e evidências, o órgão poderia 'requerer o desarquivamento do caso e proceder com novas investigações'. Contudo, o MP avalia que o relatório do perito particular não traz fatos novos. O advogado das famílias, Walisson dos Reis Pereira, disse à reportagem que se reuniu com o MP em Brasiléia e que a resposta da promotoria criminal foi de que aguarda o encaminhamento do pedido de reanálise. O pai também protocolou, na última semana, uma denúncia na Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos. "Eu nunca vi crime cometido por policiais ser analisado pela própria polícia. O Ministério Público foi totalmente omisso. Quando se põe um processo em pauta, primeiro tem que ouvir os dois lados. Em nenhum momento eu fui chamado e em nenhum momento eles ouviram o perito. Inclusive o perito continua sendo ameaçado de morte até hoje", afirmou o pai de Álvaro. "Meu filho foi executado. Na época ele tinha 19 anos, tinha um futuro promissor pela frente. Ia estudar, trabalhar, tirar habilitação dele, e teve a vida interrompida de forma cruel, desumana, arbitrária, da forma mais covarde que se possa imaginar", lamentou a mãe de Vicente. Nota de esclarecimento - MP-AC "Sobre o caso da morte dos adolescentes Álvaro Praxedes Santana e Vicente Ferreira dos Santos, ocorrida em 2 de outubro de 2020, durante uma ação do Gefron, no município de Brasileia, o Ministério Público do Estado do Acre informa que, em havendo novas informações e evidências, poderá requerer o desarquivamento do caso e proceder com novas investigações. O MPAC reafirma o seu compromisso com a verdade e a justiça, atuando com independência, transparência e responsabilidade, garantindo que todas as medidas cabíveis serão adotadas para haja uma apuração rigorosa dos fatos e a responsabilização de eventuais envolvidos" "A Promotoria de Justiça Criminal de Brasiléia aguarda o encaminhamento do pedido de reanálise, a fim de avaliar eventual desarquivamento do caso, conforme tratado durante o atendimento realizado em 05/11/2025." VÍDEOS: g1

FONTE: https://g1.globo.com/ac/acre/noticia/2025/12/14/pais-acusam-pms-envolvidos-em-morte-de-enfermeira-de-matarem-jovens-na-fronteira-do-ac-em-2020-meu-filho-foi-executado.ghtml


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